Certas escolas espiritualistas
combatem o princípio das vidas sucessivas e ensinam que a evolução da alma
depois da morte continua a efetuar-se somente no mundo invisível; outras,
conquanto admitam a reencarnação, creem que ela se realiza em esferas mais
elevadas; o regresso à Terra não lhes parece ser uma necessidade.
Aos partidários dessas teorias lembraremos que a encarnação na Terra tem
um objetivo e esse objetivo é o aperfeiçoamento do ser humano. Ora, dada a
infinita variedade das condições da existência terrestre, quer quanto à
duração, quer quantos aos resultados, é impossível admitir que todos os homens
possam chegar ao mesmo grau de perfeição numa única vida. Daí, a necessidade de
regressos sucessivos que permitam adquirirem-se as qualidades requeridas para
ter entrada em mundos mais adiantados.
O presente tem a sua explicação no passado. Foi precisa uma série de
renascimentos terrestres para que o homem conquistasse a posição que atualmente
ocupa, e não parece admissível que este ponto de evolução seja definitivo para
a nossa esfera. Os seus habitantes não estão todos em estado de transmigrar
depois da morte para sociedades mais perfeitas; pelo contrário, tudo indica a
imperfeição da sua natureza e a necessidade de novos trabalhos, de outras
provas que lhes completem a educação e lhes dêem acesso a um grau superior na
escala dos seres.
Em toda parte, a Natureza procede com sabedoria, método e morosidade.
Numerosos séculos foram-lhe indispensáveis para fabricar a forma humana; só
volvidos longos períodos de babaria é que nasceu a Civilização. A evolução
física e mental e o progresso moral são regidos por leis idênticas; não basta
uma única existência para dar-lhes cumprimento. E para que havemos de ir buscar
muito longe, a outros mundos, os elementos de novos progressos, quando os
encontramos por toda parte em volta de nós? Desde a selvageria até a mais
requintada civilização, não nos oferece o nosso planeta vasto campo ao
desenvolvimento do Espírito?
Os contrastes, as oposições que aí apresentam, em todas as suas formas,
o bem e o mal, o saber e a ignorância, são outros tantos exemplos e ensinamentos,
outras tantas causas de emulação.
Renascer não é mais extraordinário do que nascer; a alma volta à carne
para nela submeter-se às leis da necessidade; as precisões e as lutas da vida
material são outros tantos incentivos que a obrigam a trabalhar, aumentam a sua
energia, avigoram-lhe o caráter. Tais resultados não poderiam ser obtidos na
vida livre do Espaço por Espíritos juvenis, cuja vontade é vacilante. Para
avançarem, tornam-se precisos o látego da necessidade e as numerosas
encarnações, durante as quais a alma vai concentrar-se, recolher-se em si
mesma, adquirir a elasticidade, a impulsão indispensável para descrever mais
tarde a sua imensa trajetória no céu.
O fim dessas encarnações é, pois, de alguma sorte, a revelação da alma a
si mesma ou, antes, a sua própria valorização pelo desenvolvimento constante
das suas forças, dos seus conhecimentos, da sua consciência, da sua vontade. A
alma inferior e nova não pode adquirir a consciência de si mesma senão com a
condição de estar separada das outras almas, encerrada num corpo material. Ela
constituirá, assim, um ser distinto, que vai afirmar a sua personalidade,
aumentar a sua experiência, acentuar a sua marcha progressiva na razão direta
dos esforços que fizer para triunfar das dificuldades e dos obstáculos que a
vida terrestre lhe semeia debaixo dos pés.
As existências planetárias põem-nos em relação com uma ordem completa de
coisas que constituem o plano inicial, a base de nossa evolução infinita e que
se acham em perfeita harmonia com o nosso grau de evolução; mas, esta ordem de
coisas e a série das vidas que com ela se relacionam, por mais numerosas que
sejam, representam uma fração ínfima da existência sideral, um instante na
duração ilimitada dos nossos destinos.
A passagem das almas terrestres para outros mundos só pode ser efetuada
sob o regime de certas leis. Os Globos que povoam a extensão diferem entre si
por sua natureza e densidade. A adaptação dos invólucros fluídicos das almas a
esses meios novos somente é realizável em condições especiais de purificação. É
impossível aos Espíritos inferiores, na vida errática, penetrarem nos mundos
elevados e lhes descreverem as belezas aos nossos médiuns. Encontra-se a mesma
dificuldade, maior ainda, quando se trata da reencarnação nesses mundos. As
sociedades que os habitam, por seu estado de superioridade, são inacessíveis à
imensa maioria dos Espíritos terrestres, ainda demasiadamente grosseiros, em
insuficiente grau de elevação. Os sentimentos psíquicos dos últimos, mui pouco
apurados, não lhes permitiriam viver da vida sutil que reina nessas esferas
longínquas. Achar-se-iam lá como cegos na claridade ou surdos num concerto. A
atração que lhes encadeia os corpos fluídicos ao Planeta prende-lhes, do mesmo
modo, o pensamento e a consciência às coisas inferiores. Seus desejos, seus
apetites, seus ódios, seu amor mesmo fazem-nos voltar a este mundo e ligam-nos
ao objeto da sua paixão.
É necessário aprendermos primeiramente a desatar os laços que nos
amarram à Terra, para depois levantarmos o vôo para mundos mais elevados.
Arrancar as almas terrestres ao seu meio, antes do termo da evolução especial a
esse meio, fazê-las transmigrar para esferas superiores, antes de terem
realizado os progressos necessários, seria desarrazoado e imprudente. A Natureza
não procede assim, sua obra desenrola-se, majestosa, harmônica em todas as suas
fases. Os seres, cuja ascensão suas leis dirigem, não deixam o campo de ação
senão depois de terem adquirido virtudes e potências capazes de lhes darem
entrada num domínio mais elevado da Vida Universal.
***
DENIS, Léon. O Problema do Ser, do Destino e da Dor . 20.ed. Rio de
Janeiro, RJ: FEB, 1998. p.169-172
r.s.durant dart
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